Emoção Pálida
As farras ao lado dele sempre foram bem mais divertidas que as demais. Eles sabiam como aproveitar uma soirée como ninguém! Sabiam-se por demais livres e animados para estarem juntos em todas as noitadas que aconteceram. Mas foi justamente por isso que abriram as portas para que o intangível e inadmissível ocorresse.
A noite tem seu quê de mistério, tem seu quê de sedução... Saíram aquele dia para um ambiente por demais sensual, com músicas calientes e corações abertos. A turma que os acompanhava era formada basicamente de casais, mas contavam-se 9 pessoas na roda, alguém decerto sobraria.
Num ambiente daqueles, não se escapa do apelo voraz e mítico do sexo: a dança dos corpos colados, o suor a escorrer pelo corpo, a luz difusa, a fumaça que inebria e obriga que fechemos os olhos, a bebida quente e forte que rasga na garganta e corrompe os sentidos; tudo enfim contribuindo para que lábios, mãos, corpos se encontrem num abraço mágico que apaga o que existe ao redor.
Ela sentiu o desprezo a ferir-lhe como uma faca e viu o momento mágico do beijo acontecer. Viu os corpos se entrelaçarem, se buscarem, se apertarem, viu os olhos se abrirem e o sorriso nos lábios. Assistiu do camarote o espetáculo deles dois. Recostou-se na parede, respirou fundo e sentiu que dentro de si algo estraçalhara. Respirava, respirava, respirava... Sentiu os olhos molharem, fechou-os para conter a corrente que queria explodir. As mãos tremiam e as pernas fraquejavam, sentou-se e segurou a cabeça entre as mãos. Os longos cabelos ajudavam a esconder a decepção.
Pensou em se fingir de bêbada e meter-se entre os dois. Pensou em agir com naturalidade e chegar lá na roda de cara inchada e sorriso amarelo. Pensou em puxar a camisa dele e armar um barraco na frente de todo mundo. Pensou em puxar os cabelos da garota que sabia que havia algo entre eles. Mas ela ficou lá, no camarote, respirando e contendo as lágrimas, engolindo em seco, sua emoção foi pálida.
Quando voltou à roda, não tinha cara inchada, não teve escândalo, não fez nada. Ainda dançou, ainda bebeu, ainda sorriu, ainda bateu palmas, mas não era mais ela, era apenas um vulto sem alma. Esta a abandonara quando os lábios deles se encontraram.
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