Abraça tua loucura antes que seja tarde demais*
Sentada numa mesinha de um café na Paulista, ela apenas observa: são carros, centenas de carro, milhares deles, atravessando a avenida, rasgando motores nas oito faixas em mão dupla. É tudo cinza: o céu, os prédios, a fumaça que escapa... As pessoas, não. As pessoas são diferentes, coloridas, travestidas de tantos arquétipos que me deixam confusa.
Uma menina fala inglês com alguém no celular. Dois rapazes de terno passam de mãos dadas. Um outro com o cabelo punk-mocaino pintado de azul. Esse de preto se demora olhando-a, ela cora e desvia o olhar. Em poucas horas, não estará mais aqui e ela quer muito absorver o lugar. Um grupo de estudantes passa fazendo barulho, gargalhando e ela se distrai.
De repente voltam à memória quadros de um passado não tão distante. Lembra-se da época de escola, da turma, da bagunça na sala de aula. Foi há tempos... Agora, tudo o que ela queria era permanecer ali, aproveitar esta cidade, extrair dela o que há de melhor, viver nessa grande metrópole. Saudade do calorzão de lá, vontade de ficar aqui; pensa na família que não mais estará e no futuro promissor daqui; imagina as reuniões de turma em que ela não estará e saboreia cultura qye extravasa por todos os lugares.
Parte o coração e é hora de mudar.
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Não tenho palavras pra descrever o arrepio, o encantamento, o deslumbre que é o Musical O Fantasma da Ópera, em exibição no Teatro Abril, em SP. Aconselho a todos que tiverem a oportunidade de assisti-lo. É caro, mas vale o dobro do que se paga.
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Caminhando na cidade cinza, passei por uma pequena livraria, numa das esquinas da Paulista, e encontri mais um livro dele, um dos mais festejados e adorado autor das minhas amigas blogueiras, Caio Fernando Abreu. Eis um trecho do conto Dodecaedro do livro Triângulo das Àguas:
"Então invadirias subitossuave a minha porta e me falarias de coisas tão caras a mim, feitas de frágeis, falsos encantamentos, como aquele botão de rosa branca que te dei faz algum tempo, e depois se abriu espantosamente, feito uma estrela, (...) nem eu nem tu saberíamos dizer de quem partiu o início do gesto, a mão de um tocaria redondaleve a pele do rosto do outro para que começasse a acontecer tudo aquilo de beijos e suores e salivas e gritos de prazer, misturados num sonho não sei se meu o teu/meu corpo que já não sabia até onde era meu ou teu, sentindo sempre, desde antes do início do gesto, de toque, que não haveria depois, e na manhã seguinte tonta, (...) atravessaria o dia meio cega para descobrir vagamente que, além de mentiras, terias deixado em mim a semente de uma história complicada (...) até enfim te concluir primário, tosco, terrês, nunca capaz de compreender que além desta nítida dor cravada que por muitas vezes beirou a morte, porque te queria como se quer, vadia, humanamente, deixavas também um encontro que não aconteceu, que talvez nada esclareça, porque tudo é de vidro, porque brotou da confusão apaixonada que despertasse em mim, que te julguei esclarecendo a vida, peça final de um quebra-cabeça, peça inicial de outro, de um excesso de líquidos e desejos para sempre incompletos, mas que ficará, ainda que ninguém a entenda, esses ramos, esses castelos, como não ficaste, porque eras só mensagem de algo que ainda não sei."
PS: QUEM NÃO TEM UMA HISTÒRIA ASSIM???
*O título deste post tb é dele. Precisava colocá-lo aqui.
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